Noubar Sarkissian, da Čao Laru, relembra o dia em que saiu do Chile rumo à Argentina para buscar a Kombi
No comecinho de 2018, a Cao Laru fez a sua segunda viagem pra Patagônia argentina, de Kombi, saindo do Brasil. Chegamos ao lugar mais ao Sul, na cidade de Esquel, que fica a 500 km de Bariloche. Como às vezes o destino nos prega peças, a Kombi foi quebrar exatamente no ponto mais ao sul que a banda já esteve em toda a sua história. Quebrou o câmbio, o que é difícil de consertar, e não existem peças novas da Kombi na Argentina. A peça teria que vir do Brasil e demoraria 17 dias pra chegar.
Durante esse período que a kombi ficou parada, a banda tinha uma agenda intensa de shows e decidiu que ia fazê-los mesmo assim. Continuamos subindo rumo ao norte, indo de carona, indo de ônibus, da maneira que a gente conseguia, inclusive carregando um contrabaixo acústico. Muitas pessoas nos ajudaram a chegar aos lugares. Fomos subindo, subindo, até que chegamos à fronteira com o Chile. Entramos no país e estávamos rumo à cidade de Concepción, onde tínhamos um show no dia seguinte, quando recebemos a notícia de que a kombi tinha ficado pronta. Naquele momento estávamos indo muito ao norte, cada vez mais longe da kombi. Era preciso buscá-la, mas tínhamos o show no dia seguinte. Teríamos que ir e voltar em 36 horas.
Fomos, Laura (Babette, cantora, compositora e acordeonista) e eu. Conseguimos uma carona e passamos a fronteira Chile-Argentina de novo. Ficamos o dia todo descendo até a Patagônia com outras caronas e carros emprestados de amigos até chegarmos em Esquel, onde a Kombi estava pronta. Entramos nela às 6h da manhã. O show em Concepción era à meia noite noite daquele mesmo dia. Tínhamos 1.100 km pela frente. Foi uma das viagens mais emocionantes da minha vida: enquanto íamos tocando adiante, dava pra ver as mudanças de paisagens na Patagônia, dava pra sentir o frio indo embora… Chegamos na fronteira mais difícil que a gente já passou na nossa vida, que é a da Argentina com o Chile. Dessa vez precisava ser fácil, se não a gente não ia chegar a tempo. Nessa fronteira, eles olham tudo dentro do carros, mas dessa vez a nossa kombi estava vazia. Foi fácil, e seguimos.
Só parávamos pra ir ao banheiro, comíamos lanches dentro da kombi mesmo e revezávamos ao volante. A comunicação com a banda era ruim, nós só tínhamos internet quando parávamos em algum posto. Eles estavam morrendo de ansiedade pra saber se a gente ia chegar. Aquele seria o concerto com maior público da nossa turnê até ali, era uma casa de shows grande. A hora do show foi chegando, a banda foi passando o som, inclusive dos nossos instrumentos (acordeon e violão), acho que já sem muita esperança que fossemos chegar. Chegamos à casa de show faltando 5 pra meia noite. Tinha pessoas na fila pra entrar, elas olharam a kombi e falaram “ué, a banda tá chegando agora!”.
Entramos na casa, a galera da banda gritando de alegria, porque eles já não esperavam que a gente fosse chegar. Eu e Laura trocamos de roupa e 5 minutos depois estávamos em cima do palco. Foi um dos melhores shows que a gente fez. Estávamos muito, muito cansados, mas tem a adrenalina que o palco dá, né? Tinha uma sensação de final de filme. Foi o nosso maior cachê nessa turnê.
Noubar Sarkissian é músico, cantor, compositor e um dos fundadores da Čao Laru. O depoimento foi dado a Eduardo Lemos.